A morte como drama existencial e mistério de fé

Um consenso que temos na sociedade e nas diversas culturas é a convicção de que mais cedo ou mais tarde todos nós morremos. A morte é  umas das poucas certezas absolutas que temos nesta vida. As diferentes culturas encaram de modo diversificado este tema, mas todos elas sem exceção, enxergam a morte como um momento de dor, buscam respostas e alívios para encararem um drama inevitável da existência.

A cultura judaico-cristã compreende a morte como consequência natural do pecado e inerente fragilidade da vida ferida com o rompimento entre a humanidade e Deus. Contudo, nunca faltou a perspectiva da Esperança e da eternidade nesta relação do humano com o Divino, ao longo da história da salvação. Mesmo com o ser humano expulso do paraíso, (lugar da vida plena sem a força do mal e da morte), o próprio Deus não desiste de salvar e resgatar a criatura humana ferida pela realidade do pecado e da morte.

Quando na plenitude dos tempos Deus envia seu filho ao mundo, ele nasce, vive e morre e, com sua própria morte, vence para sempre e nos resgata o paraíso perdido. Na morte de Cristo, e como consequência imediata sua ressurreição gloriosa, a vida assume outra perspectiva,  já não somos mais devedores da morte, mas vencedores sobre ela e sobre suas consequências.

Não resta dúvida que a morte será sempre um mistério, digno das mais diversificadas teorias e interpretações, mas o que não podemos negar é que com a luz do triunfo de Cristo sobre a morte, ela não é mais considerada um mistério, como se fosse algo obscuro e cercado de incertezas. Ela é um mistério de fé! E não mais uma realidade desconhecida, estranha e decepcionante. A morte iluminada pela fé nos enche de esperança e confiança, e, acima de tudo, nos traz certeza e compreensão mística para lidarmos com ela, não como um monstro e nem como tragédia final.

A morte é a grande pedagoga da vida. Durante toda a nossa existência vamos aprendendo a lidar com perdas e ganhos, e só ganha de verdade na vida quem sabe lidar com as perdas. Só ganha inteligência, conhecimento e êxito na escola da vida quem sabe “perder”. A vida só ganha sentido pleno, para  quem sabe se gastar em função do outro. Pense num pai ou  numa  mãe  que se gastam por inteiros para dar vida aos filhos e vitalidade à família constituída.

Os grandes ganhos na vida se fazem com as perdas e mortes do cotidiano. A capacidade de ceder, de morrer para si, de engolir o orgulho, de vencer a própria soberba, de silenciar, escutar e exercitar a paciência. A morte parece que nos rouba ou leva a nossa vida. Quando na verdade ela plenifica e transfigura as mais penosas realidades humanas em eternidade e nos permite recuperar o paraíso perdido.

A perda maior da vida não é a morte. Ela é a  porta final da glorificação da realidade humana de forma definitiva e verdadeira. Não podemos negar que  a morte  machuca, dói, assusta, surpreende e até tira o nosso chão. Só não podemos deixar que ela mate nossa fé, nossa esperança e nos tire do caminho da eternidade, conquistado com o sangue, o suor e a própria morte do Filho de Deus, para nos conceder a vida eterna.

 

*Padre Róger Araújo, é jornalista e membro da Comunidade Canção Nova. É autor dos livros “João Paulo II – Uma vida de Santidade” e “Repensando a Vida” (Editora Canção Nova). @rogeraraujo.cn