Cinema em Cosmópolis fez história e deixou saudades no município

Um dos lazeres mais marcantes da cidade de Cosmópolis, e que hoje deixa saudades, é o cinema. Apenas em dois endereços fixos no município, o Cine Avenida (Avenida Ester, onde hoje é a loja Seller Magazine) e o Cine Cosmópolis Plaza, no shopping da cidade, marcaram história com a transmissão de grandes filmes e sucessos de bilheteria. Pensando em resgatar parte desta história da 7ª arte em Cosmópolis, a equipe do Jornal GAZETA de COSMÓPOLIS entrou em contato com Ocimar Da Vinha, que esteve à frente do cinema da cidade durante muitos anos. Acompanhe a trajetória:

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GAZETA de COSMÓPOLIS: Por quanto tempo esteve à frente do cinema na cidade de Cosmópolis?
Ocimar Da Vinha: Considerando o Cine Avenida e as salas do Cine Cosmópolis Plaza, foram uns 25 anos de cinema.

GAZETA: Neste período, qual foi a sua maior satisfação?
Ocimar: A satisfação é poder promover a cultura. Proporcionar diversão e lazer para as pessoas, através da magia do cinema. A dedicação dos funcionários do cinema. Era um prazer imensurável.

GAZETA: Quais as principais dificuldades desse tipo de serviço?
Ocimar: Nos anos 80, 90, exibir filmes era muito difícil. As companhias de cinema liberavam os filmes primeiro para as capitais e grandes cidades, depois para as cidades com mais de 300 a 100 mil habitantes e depois as praças menores, como a nossa. Os filmes eram em 35 milímetros, as cópias se desgastavam, riscavam com o tempo, algumas cenas eram perdidas devido a esse desgaste; os transportes dessas cópias eram feitos, na maioria das vezes, de carro e tínhamos que ir retirar o filme na cidade em que estava sendo exibido.
Os filmes, quando chegavam em Cosmópolis, já tinham rodado o Brasil inteiro e, algumas vezes, as cópias apresentavam algumas falhas. Enfim, foram épocas difíceis. O lado bom foi que, com as dificuldades, aprendemos a negociar e fizemos muitos amigos no meio cinematográfico. Amizades estas, que possibilitaram lançar filmes simultaneamente junto com as principais salas de cinemas do Brasil nas salas do Cine Cosmópolis Plaza. Mesmo sendo uma cidade de porte pequeno, lançávamos os principais filmes daquela época antes de muitas cidades grandes, entre eles Harry Potter, Homem Aranha e muitos outros lançamentos.
Outra grande dificuldade era na parte técnica, pois os custos eram elevadíssimos, muito custosos. Serviços de reparos dos projetores eram absurdos, pois as peças eram importadas, poucos fornecedores, poucos técnicos. Manutenção demorada.
Hoje, apesar de a projeção ser digital, os custos operacionais e técnicos continuam elevados, os equipamentos são todos importados e caros. O que mudou é que temos mais pessoas interessadas em cinema.

GAZETA: Há quanto tempo se encerraram as atividades? Qual o principal motivo? Há uma possibilidade, mesmo que mínima, de um dia voltar?
Ocimar: Acho que já faz uns 10 anos. Apesar das salas serem modernas, o shopping nos vendeu uma proposta de mix de lojas naquela época dsc_0004-1_sitee, com o fechamento dessas lojas, o shopping perdeu o interesse do público e o nosso público foi se esfacelando junto. Os custos ficaram elevados, nosso relacionamento com o shopping se deteriorou de tal forma que foi melhor ir embora.
Possibilidades de voltar? Sim, sempre tem. Por que não? Mas, por se tratar de um investimento alto, custos operacionais idem, preços de ingressos também elevados e por vivermos em um pólo populacional reduzido, precisamos aguardar as consequências das novas mídias no meio cinematográfico. Hoje, podemos assistir um filme em Blu-Ray, dvd, pela internet, pelo celular e outros dispositivos eletrônicos; os filmes são lançados em outras plataformas quase que simultaneamente do lançamento do filme. Temos a pirataria e, hoje, você assiste lançamentos na internet! Algumas pessoas gravam o filme, diga-se de passagem, gravações horríveis, dentro da sala de cinema e disponibilizam o conteúdo na internet, enfim, precisamos ter uma noção clara de quanto tudo isso vai impactar nas salas de cinema de uma cidade interiorana.
Já temos uma ideia, mas precisamos de um pouco mais de tempo para analisar a viabilidade ou não de um empreendimento desse porte.

GAZETA: Existe uma estimativa de quantas pessoas já passaram pelas suas salas de cinema?
Ocimar: Nesse momento, fica difícil quantificar, pois, levaria um tempo para ser bem preciso, mas, com certeza, umas 3 a 4 vezes a população de Cosmópolis atual.
Vejam quais foram os filmes que mais atraíram o público cosmopolense:
“Partindo de 1985, os principais filmes foram:
Os Caçafantasmas;
O Exterminador do Futuro;
Todos os filmes da franquia Os Trapalhões;
Todos os filmes da franquia Rambo, de Sylvester Stallone;
A Hora do Espanto;
Dirty Dancing;
Esqueceram de Mim;
Todos os filmes da franquia Homem Aranha;
Alguns filmes da franquia Harry Potter;
O Senhor dos Anéis;
Transformers;
Piratas do Caribe;
Os Simpsons;
Shrek;
e muitos e muitos outros”.

GAZETA: Na estrutura, quantas salas havia em Cosmópolis? Quantas pessoas acomodavam em um único horário?
Ocimar: No Cine Avenida que nós adquirimos do saudoso Hardy Kowalesky, em meados de 1985, era apenas uma sala com capacidade para 320 pessoas. No Cosmópolis Plaza, eram 3 salas, com capacidade, das 3 salas juntas, para 420 pessoas.

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GAZETA: Como é a legislação em relação a esse serviço?
Ocimar: Uma legislação rígida, quanto a segurança, o que é normal por se tratar de colocar uma determinada quantia de pessoas juntas sentadas por quase 2 horas. Agora, na parte operacional, a parte mais difícil é a exigência de exibir uma determinada quantia de dias de filmes nacionais durante o ano todo por sala, impostos e também o pagamento de um percentual do preço do ingresso para o Ecad pelas músicas tocadas antes de exibir o filme e também as tocadas nos filmes, diga-se de passagem, um absurdo, pois quando se vai produzir um filme, os produtores já negociam os custos do uso dessas músicas.
Existem cidades que cobram ISS, que não era o caso de Cosmópolis, desde que o cinema vendesse meio ingresso para todo o público 2 vezes por semana e permitisse a entrada gratuita de pessoas acima de 60 anos. Isso, inclusive, dentro de mais alguns anos, vai ser impossível. No máximo, o que poderá ser feito é cobrar meio ingresso das pessoas com mais de 60 anos. No futuro, essa legislação necessitará de alguns ajustes para os cinemas sobreviverem por aqui.
Sobre o começo desta história ainda temos Valber Kowalesky e a memória dos trabalhos do pai, Hardy Howalesky neste meio:

A memória de Hardy Kowalesky é muito viva através do filho, Valber Kowalesky. As histórias do cinema cosmopolense realmente foram marcantes e o fato pode ser confirmado através de acervos. Valber relembra “O primeiro cinema em Cosmópolis, que era o local onde passou a ser o Cine Avenida anos depois, foi o Cine Jahu, que começou em 1919 e seus proprietários eram um grupo de acionistas. O mais forte deles era ligado a Usina Ester. Este grupo perdurou até os anos 50, quando locou o espaço para os irmãos Calvo, que compraram os prédios do cinema e ficaram com eles até o final.
Meu pai começou muito cedo no cinema, em meados de 1950. Seu amigo era Durval Dias de Arruda, ele e outro senhor chamado Herdin, tinham uma Companhia de cinema ambulante, e acabou que meu pai comprou a parte desse Herdin e se tornou sócio do seu Durval. Por muito tempo, ele se apaixonou pelo cinema; ele gostou da área, se interessou muito. Logo depois, ele começou a fazer filmagens, comprou projetores – isso foi até 1985, quando ele encerrou as atividades. Mesmo assim, ele tem muita coisa, guardou muita coisa que está conosco, sua família.

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Primeiramente, era o cinema ambulante, que era transmitido nas fazendas, nos bairros, nas colônias da Usina Ester. Em quase todas, havia a transmissão de filmes pelo menos uma vez por semana. As telas eram colocadas, normalmente, em um campo aberto, em um pasto, e o pessoal trazia as cadeiras de casa para sentar. Era muito interessante porque não eram todos que tinham televisão em casa, eram poucos. Nos anos 60, principalmente, era aguardada, com ansiedade, a achegada do dia, em que seria transmitido o filme.
Às segundas-feiras, o filme era transmitido na sede da Usina Ester; às terças-feiras, no Carandina; às quartas-feiras, era uma colônia da Usina Ester; às quintas-feiras, era no Saltinho; e às sextas-feiras, era na Granja. Além disso, no Sábado, transmitia-se o filme na Rhodia, e chegou a passar filmes na cidade de Americana, cidades próximas, em outras fazendas e também tinha um cinema em Paulínia, no bairro São José. Hoje, é bom saber que a cidade possui um dos maiores pólos cinematográficos do país.
Depois, no começo dos anos 70, ele foi contratado no Mútuo Socorro, onde também havia o cinema

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Hardy Kowalesky foi um dos pioneiros do cinema em Cosmópolis

. Logo, em 1974, ele assumiu o Cine Avenida, que estava fechado, abandonado. Nesta época, ele reformou o cinema, primeiramente, a cabine, com aparelhos novos, aparelhos de som de alta qualidade… Foi a época dos filmes brasileiros, As Pornochanchadas, Os Mazzaropis, Os Trapalhões… Eram filmes falados em português, então, se fazia muito necessário que a qualidade do som do cinema atendesse aos frequentadores, visto que não tinha legendas desta vez, era preciso ouvir e entender o que se era falado.
No Cine Avenida, especificamente, meu pai, Hardy Kowalesky, pegou uma fase muito boa. Ele foi arrumando o cinema, trocando as cadeiras por outras estofadas, trouxe uma pessoa fantástica para trabalhar com ele, que era o Nadir Nallin Grasso. Foi uma época de ouro, época de grandes filmes, sucessos de bilheteria, como Terremoto, Tubarão, O Exorcista, que na época eram filmes que atraiam muitas pessoas. Passou muita gente por lá; no começo, passavam filmes sextas, sábados, domingos e segundas-feiras, e depois, eram todos os dias tamanha demanda.
Me lembro que vinha muita gente de Artur Nogueira, pois lá não tinha cinema. Aos domingos, era muito normal haver grandes filas na porta do cinema, quase 100 m, e se via de longe o quarteirão lotado. Há muitas histórias realmente em relação ao cinema cosmopolense. O cinema aqui em Cosmópolis teve uma história muito bonita, muito rica, mas que, infelizmente, pelo processo também acabou”, finalizou Valber.