Como lidar com a dificuldade de ouvir não?

É necessário passar por essa fase, pois, lá na frente, essa pessoa será um adulto mais preparado emocionalmente para a vida

Ouvir “não” é inevitável na vida de todas as pessoas. Afinal, nem tudo acontece como se imagina e espera. Algumas pessoas conseguem lidar melhor com isso, mas outras ficam muito desapontadas, ou frustradas.

Maristela Lopes Ramos
Psicóloga
CRP: 06/136159
R. Santo Rizzo, 643
Cel: (19) 98171-8591

Essa maneira de aceitar de uma forma “mais simples” os “nãos” tem a ver com o modo como a pessoa foi criada. Se desde pequena a criança alcançava tudo o que queria, ou na hora que queria, a pessoa cresce esperando que o mundo lhe diga sim sempre. Muitas vezes, até com alguns comportamentos mais conhecidos como “birras”, choros, gritos, cara feia, não comer, não conversar, entre outros, fazia com que os pais lhes fizessem as suas vontades. A criança vai aprendendo que, com esses comportamentos, ela consegue o que quer.
Os “nãos”, na verdade, são uma forma dos pais colocarem limites, muito necessários na educação de uma criança. Sem limites, pode-se crescer com uma percepção distorcida de si mesmo e dos outros. Pode haver uma incapacidade de se colocar no lugar do outro, isto é, ter empatia, já que sua preocupação maior será seus próprios interesses e vontades, sem ao menos enxergar o quanto isso afeta as relações. A tendência é a busca de relacionamentos com pessoas que se submetam às suas vontades, assim como seus educadores fizeram.
Hoje em dia, a maioria dos pais trabalha fora e, consequentemente, tem pouco tempo presente fisicamente com os filhos. Tentam compensar essa falta fazendo todas as vontades dos pequenos, ou suprindo-os com presentes, e sendo permissivos nos seus quereres.
A superproteção também pode acontecer nessa fase, que é quando os pais tentam proteger ao máximo os filhos de passarem sofrimentos emocionais, principalmente, a frustração. Alguns pais podem até terem passado por muitas frustrações em sua vida desde a infância e desejam poupar seus filhos de passarem o mesmo que eles.
É preciso ser dito que é na infância e na adolescência que uma pessoa mais aprende a ter essa capacidade de ouvir os “nãos”, se frustrar e, ainda assim, seguir em frente. Se for preciso, lutar, persistir, ou até mesmo desistir de alguma situação que gerou esses sentimentos frustrantes.
Se não for aprendido com os pais ou cuidadores, a vida, o mundo irão ensinar da maneira mais dolorosa. A vida não terá o amor dos pais nessa lição.
Sempre é mais difícil e doloroso quando temos que aprender algo relacionado às emoções e sentimentos na idade adulta. É muitas vezes a custo de muita psicoterapia.
O oposto da situação também pode ocorrer, educações muito rígidas, em que se recebem muitas negativas durante a infância, e crescer querendo ouvir somente o sim. Também não suportará os “nãos”.
Saber ouvir “não” é um sinal da consciência de que há conquistas difíceis e até as impossíveis, e que muitas vezes é obrigatório ter paciência em aguardar o momento certo para as coisas acontecerem. É imprescindível suportar o mal estar de não se poder ter tudo o que se quer e na hora que quer.
Quando a pessoa aprende a aceitar os “nãos”, provavelmente ela criou dentro de si a faculdade de lidar com contrariedades e, dessa forma, ganha mecanismos para resolver outros conflitos de forma mais equilibrada, ou seja, sem desespero, inconformismo, raivas impróprias e brigas desnecessárias. Torna-se tolerante. A falta dessa habilidade pode trazer características como a arrogância e o autoritarismo, querendo que as coisas aconteçam apenas do seu jeito, impondo sem levar em consideração o querer e o espaço do outro. Pode haver também resistência em obedecer a ordens e seguir regras. Pode haver outro extremo, em que ao ouvir um não a pessoa pode pensar que se lhe negam isso é porque ela não tem capacidade de fazer direito e que sempre a saída é desistir.
Percebe-se, então, o quanto se pode ser afetado psicologicamente se não se passar por esse aprendizado desde a infância. Cabe aos pais, cuidadores e educadores conseguir dosar esse equilíbrio dos “sins e nãos” na vida dessas crianças e adolescentes. Mesmo que venha um choro ou uma raiva, não sentir culpa por isso é necessário passar por essa fase, pois, lá na frente, essa pessoa será um adulto mais preparado emocionalmente para a vida.