De volta ao passado

13/06/1930 – Há completar 92 anos – Após a missa campal, realizada nas escadarias da velha igreja de Santa Gertrudes de Helfta, ao fundo, projeto do renomado arquiteto Ramos de Azevedo, os fiéis fazem os aprestos para a saída da procissão em louvor a Santo Antônio. A esplendorosa imagem religiosa, confeccionada em madeira na Itália, inúmeros lírios brancos enfeitam uma capelinha estruturada de bambus, realçando a flor símbolo da pureza e insígnia divina de Santo Antônio.

Na direita, meninos carregam outro andor, repleto de folhagens verdes e rosas brancas, consagrando uma pequena imagem de Nossa Senhora, seguindo ao fundo de Santo Antônio, um altar dedicado ao Sagrado Coração de Jesus, com auréola de estrelas e flores.
Altivos nas mãos dos ministros da igreja, notabilizam lábaros de São João Batista, São Pedro e Santo Antônio, manualmente desenhados e adornadas as bandeiras dos santos de junho, pelas habilidosas bordadeiras da “Villa”. No antigo “Largo da Matriz”, então Praça Izabelita Barboza de Oliveira Vieira, os devotos iniciam o egresso da procissão. Com saída pela rua Alexandrina Nogueira Ferraz, atual Dr. Campos Salles, caminhavam envolvendo com orações e louvores sua procissão nas vias de terra, previamente batidas e molhadas pelo carroção da subprefeitura, evitando transtornos da poeira.

Entre os fiéis, muitos casais pedindo a perfeita união e fartura para a família, homens e mulheres solteiras, separados em grupos, buscam as bênçãos do matrimônio, meninas vestidas de anjinhos, promessas familiares, agradecem graças alcançadas, devoções pela intercessão de Santo Antônio. Ao centro, envolto das anjinhas, está o padre Victor Randuá, marcante sacerdote da Paróquia Santa Gertrudes, na esquerda dos lábaros, o proprietário do cartório de notas, Tarcílio Mattioli e esposa, seguidos do casal Lafayette Álvaro de Souza Camargo, diretor da Usina Ester e renomado agrônomo, e Odila Egídio de Souza Camargo, conceituada professora e filantropa, nomes de ruas, avenidas, escolas e importantes centros sociais.
Neste período, as celebrações e festividades recebiam o apoio das doações do casal Souza Camargo, possessores de inúmeras propriedades rurais, dentre elas a famosa Fazenda Brandina, sendo os precursores do gado holandês no Brasil, utilizado na importante indústria de laticínios Granja, fundada pelo Dr. Lafayette. Não possuindo filhos, o casal realizava inúmeras ações sociais pelas crianças carentes, principalmente, nas vilas campineiras, as festividades de Santo Antônio eram o marco filantrópico em Cosmópolis. Muitas crianças da vila, fazenda Usina Ester, núcleos coloniais e bairro rurais cosmopolenses, receberam os seus primeiros pares de calçados, então quase inacessíveis para muitos, através das doações do casal, realizadas anonimamente nas festividades.

Anos depois, quando saiu da Usina Ester, Dr. Lafayette foi nomeado prefeito intendente de Campinas, criando com recursos próprios, centros e moradias populares, instituindo a Fundação Odila e Lafayette Álvaro, doando a Fazenda Vila Brandina e outros recursos financeiros, como patrimônio para viabilizar os trabalhos e continuidade permanente das ações. Quando o casal residiu na Fazenda Usina Ester, as trezenas de Santo Antonio, treze dias de orações, seus olhares observando as famílias e crianças, suas roupas, calçados e saúde, anotando aqueles em situação de vulnerabilidade. Secretamente dona Odila, a qual lecionava em escolas rurais e salas improvisadas, entregava uma lista com os escolhidos e as doações ao Padre Victor, distribuídos nos dias que antecediam a procissão. Doações sempre em nome de Santo Antonio, o qual fazia o mesmo gesto caridoso em vida, entregando a fortuna da família aos pobres.

O jovem Padre Victor Randuá é o responsável pela reorganização religiosa das celebrações de Santo Antônio, tornando as cerimônias os maiores eventos populares da vila, superando até mesmo as festividades de Santa Gertrudes, Padroeira católica de Cosmópolis.
Filho de imigrantes italianos, Padre Victor era extremamente devoto do santo, é considerado um dos principais nomes católicos de Americana, onde foi responsável pelas obras de construção da Basílica de Santo Antonio, dentre as maiores do mundo. Em Americana, permaneceu até 1927, sendo designado para outras vilas e pequenas paróquias da região Funilense, até ordenar-se na “Villa Cosmópolis”, em 13/10/1929. É o criador da receita do pão e bolo de Santo Antônio, tradicionalmente distribuídos no fim da procissão, assim como do primeiro hino de Cosmópolis.

Texto Adriano da Rocha: (Curta e siga @CentrodeMemoriaCosmopolis)- Foto: cervo Família Azevedo