De volta ao passado

1981 – há exatos 41 anos – Em destaque, o “passadouro” do tapete de Corpus Christi na rua Eurides de Godoy, continuidade do percurso inicial da procissão pelas ruas Ramos de Azevedo e Santa Gertrudes, prosseguindo a passagem na rua Del. Antônio Carlos Nogueira, retornando pela rua Dr. Campos Salles, até o largo e escadarias da Matriz. Na imagem, ao fundo esquerdo, é notabilizado o então reservatório central de armazenamento e distribuição de água, conhecido Castelo, realçando sua torre. Outros percursos maiores, anos 1970, circundavam as vias de acesso ao templo religioso, integrando a rua Expedicionários na passagem dos tapetes.

Caminhos da procissão realizada pela Paróquia Santa Gertrudes, Igreja Matriz, unificando todas as comunidades católicas cosmopolenses, reunidas na tradicional confecção dos tapetes, e sobretudo, na fé pelo Santíssimo Sacramento do Corpo e Sangue de Cristo.
Eram meses de preparativos para as elaborações e confecção dos tapetes, sempre marcantes nas vésperas e madrugadas de Corpus Christi, reunindo pais, filhos e avós das comunidades, agrupados nas inúmeras fases das criações. Em cada ano litúrgico, mais grandiosos, intensos e significativos tornavam-se os desenhos da vida, morte e renascimento de Jesus Cristo, principalmente, as retratações dos santíssimos sacramentos.

Os “tapeteiros de Corpus Christi” amanheciam nos trabalhos de confecção, ordenados pelos párocos, ministros e catequistas da época, direcionados em grupos nas fases das obras, como os desenhos figurativos usando giz nas ruas, moldes e os preenchimentos com os mais diversos materiais. Na terra dos canaviais, bagaços de canas moídas não faltavam, doados em gigantescas quantias pela Usina Ester, aos inúmeros fardos de serragens das serrarias locais, armazenados exclusivamente para as confecções dos tapetes.
Em enormes tambores, baldes e bacias de ferro, aconteciam os tingimentos dos distintos materiais, separados em tons de azul, verde, vermelho e amarelo. Para os tingimentos, surgimento das cores específicas, os tapeteiros utilizavam dos comerciais “pó Xadrez” e anilina, aos tingidores de roupas Tupi e Guarani, impregnando os materiais e as mãos dos artesãos.

As cores preta e branca, marcantes nos traços e realces dos desenhos, surgiam de meses guardando sobras de café e cascas de ovos, cuidadosamente reunidas pelas donas de casas e padarias.
Garrafas velhas e cacos de vidros, moídos cautelosamente, ornamentavam coroas, olhos, luzes celestiais, letras e sacramentos, aproveitando os mais surpreendentes insumos, realizando cada artesão suas técnicas específicas, surgindo singulares desenhos pelos quarteirões.

Os austeros sermões do Monsenhor Rigotti, pároco da Igreja Matriz de Santa Gertrudes, condenavam utilizar sal e farinhas nas confecções. Segundo Monsenhor, os alimentos são santificados, símbolos da fartura do homem na terra, estando inadmissíveis nas representações do evangelho e sacramentos. Outro detalhe, os desenhos somente eram preenchidos com os materiais, após as aprovações do Monsenhor e ministros, inspecionando todos os trabalhos. Cada quarteirão, passadouro dos tapetes, existia um padrinho e madrinha, responsáveis pelas distribuições de lanches, bolos, cafés e chás quentes, imprescindíveis nas noites frias de junho. No fim da procissão, os tapeteiros com o apoio da Prefeitura de Cosmópolis, realizavam as limpezas das ruas, recolhendo os materiais. A missão estava comprida, a fé representada e confirmada em mais um ano.

Texto: Adriano da Rocha (Siga e curta @AcervoCosmopolense) – Foto: Delei Santos