O pai que não conhecia…

Oscar do Carmo Silva Neto MTB – 66134-MT/SP
saudadedaminhaterra@hotmail.com.br
Rádio Livre Expressão Web
Programa aos domingos
Horário: 12h até às 15h
(19) 99752-3636

Desde que ele ainda era criança, o pai lhe parecia um gigante. Um exemplo de homem em tudo.
O pai trabalhava numa empresa e, nos fins de semana, dava folga como porteiro de um condomínio, mas, quando estava em casa, ficava mexendo na casa cuidando da manutenção. Poucas vezes pode sair com o pai a um passeio. Essa poucas vezes, pouco acrescentou a amizade entre ambos. Sempre calado e cuidado com o que dizia.
Passou a vida toda trabalhando para cuidar da esposa e dos filhos. Ele, um dos mais novos, um dia começou a trabalhar num estúdio de rádio. Começou a apresentar um programa à noite. Ele dava sugestões a namorados e brincava com eles quando lhe telefonavam. O programa foi um sucesso entre os jovens da época, ultrapassando de longe as expectativas. Os fãs enviavam cartas e vinham até ele quando o viam.
Os comentários do programa surgiam também entre familiares e amigos. O pai parecia desinteressado. Para ele, aqueles diálogos diante do microfone eram brincadeira de criança. Dizia que o filho fazia “showzinho”.
Logo se casou, mas não deixava de fazer as visitas semanais aos pais. Numa tarde, a mãe lhe disse que o pai estava doente e que era pra eles, filhos, visitá-los mais vezes.
Certo dia, ele foi internado e passou por uma cirurgia grave. Ele ia ao hospital frequentemente. Ali no quarto, quando ficavam a sós, esgotadas as palavras de consolo, e como não demonstrasse qualquer interesse pelo trabalho do filho, ficavam ali juntos calados. Certa noite, o pai lhe disse que deveria ter feito mais pela família e que trabalhou sem pensar ouvir os filhos. Aquelas palavras ficaram em sua mente.
O programa de rádio continuava como se nada tivesse acontecendo. As emoções dos ouvintes que ligavam ficavam mais acentuadas a cada programa. Ele escutava seus problemas com paciência e dava-lhe conselho que podia. Numa dessas noites, se envolveu com o problema do pai e disse que ele estava muito doente e internado.
No dia seguinte, foi visitá-lo como de costume. Havia um buquê de flores à sua cabeceira. Alguns ramos embrulhados num papel simples.
– Alguém me mandou hoje, dizendo que é sua ouvinte – disse com um raro sorriso.
O cartão estava assinado: “De uma amante da música”. Desejava a seu pai um pronto restabelecimento.
No sábado seguinte, o pai ligou o rádio que tinha na cabeceira e, pela primeira vez, prestou a atenção ao trabalho do filho. E passou a ser habitual.
Numa das visitas ao hospital, ele lhe disse num tom diferente:
– Seu programa é mesmo bom. Leva consolo e paz aos aflitos. Continue assim.
O pai lhe olhou com ternura reconhecendo o que o filho fazia. Compreendeu que falar com as pessoas pelo rádio era um trabalho significativo. Pela primeira vez, em todos aqueles anos, elogiou o que o filho fazia.
Quando teve alta, pediu para conhecer a rádio. Ele andou pela ala com dificuldades, mas estava feliz. A doença estava avançada. Um dia, o pai se foi…
Até hoje, ele não sabe quem enviou as flores. A “amante da música”, certamente, nem se dá conta de que aquelas flores foram um tesouro na vida do pai e dele. A gentileza que ela fez se desabrochou numa riqueza que lhe fortalecerá pelo resto da vida.