Significado do brinquedo e o brincar na vida do ser humano

Psicóloga fala sobre a relação entre crianças e o apego a itens materiais

Quem conserva memórias da infância certamente se recorda de algum brinquedo que teve. Brinquedo é um objeto ou uma atividade lúdica e geralmente associada à criança e que hoje em dia deixou de ser pensado apenas como um mero passatempo para a mesma. Com os brinquedos, as crianças conseguem transitar do mundo real para o universo do imaginário. O brincar de faz-de-conta desenvolve a saúde mental da criança. Um exemplo disso é quando, muitas vezes, elas fantasiam sobre o que fazem os brinquedos quando estão sozinhos no quarto e não tem ninguém olhando, como se tivessem vida própria.
Preocupante ver crianças que, ao invés de brincar, somente colecionam ou apenas tentam reproduzir o cenário ou a história descrita na caixa de um brinquedo ou no comercial da televisão. São crianças que têm barrada sua possibilidade de fantasiar. Imaginemos uma criança que tem uma boneca Barbie e que a criança queira transformá-la numa bruxa, nada que algumas canetinhas, uma tesoura e alguns pedaços de pano não resolvam, e isso não é destruir, é brincar, é a criança se utilizando do faz-de-conta.
As crianças não são diferentes dos adultos em sua relação com os objetos de consumo, irão escolher os brinquedos que estão em alta como os personagens de filmes, desenhos animados, youtubers, entre outros. Quando se pensa em estimular as crianças para a imaginação criativa ou a fantasiar, pareceria mais correto ter brinquedos sem história, sem marcas, ou seja, sem marketing. A ideia é oferecer objetos menos carregados de significados prévios para uma maior liberdade para criar. As histórias infantis também ensinam muito aos pequenos.
Os brinquedos são representantes da magia inicial da vida, mas vão perdendo seu espaço. O crescimento exige uma mudança de ambiente, a infância não pode mais estar tão visível, a adolescência já vem chegando. Com o crescer, chega uma necessidade de passar adiante os brinquedos aos mais novos ou doá-los, isso é natural, porém, ocorre com certa tristeza. Crescer é um longo processo de desencantamento dos objetos que nos cercam.
A vida torna-se incompatível com os brinquedos no quarto e eles desaparecem. Porém, existe o brinquedo virtual, existe a possibilidade de brincar no computador ou celular. Surgem jogos bem interessantes. A questão é que o ambiente virtual é invisível, fica mascarado que é uma forma de brincar, inclusive, é dito que se está “jogando”. Entende-se que jogo é para gente crescida. Há, de alguma forma, uma vergonha de se estar brincando tardiamente. Com isso, os jovens podem seguir brincando mais tempo. O problema que acontece é que esse ambiente virtual abriu espaço para vários tipos fóbicos sociais, ou para os que têm dificuldade com a vida adulta que passam a vida refugiados em seus jogos. Utilizam-se da fantasia como defesa contra o crescimento. Não se deve confundir também, quem, às vezes, brinca,daqueles com que levam a vida na brincadeira, são situações distintas. Existe até uma síndrome relacionada a essa dificuldade de crescer em que a pessoa recusa-se a crescer e ter as responsabilidades do mundo adulto: síndrome de Peter Pan (talvez assunto para uma próxima matéria).
Comum também são as crianças se apegarem a brinquedos, ou a algum outro objeto como paninho, chupeta, cobertor, travesseiro. Normalmente, são eleitos já no primeiro ano de vida e são conhecidos como objetos de transição. Surgem como apoio para suportar a angústia de separação da mãe e mais tarde auxiliará a lidar com outras angústias, tristezas, inseguranças, medos e frustrações. Pode ser até uma “mania”, chupar o dedo, enrolar o cabelo, entre outras que têm a mesma função: acalentar a criança em momentos de inseguranças e angústias. Normalmente, são deixados de lado entre 3 a 5 anos quando a criança começa a ter um vocabulário e consegue expressar o que quer e sente.
É preciso estar atento nesse caso, em que a criança não larga o objeto por nada ou se a mania ficar exagerada, ou que a criança já passou de 6 anos e continua apegada, é aconselhável conversar com o pediatra da criança ou com o psicólogo. As manias ou o apego aos objetos podem também ocorrer mais tarde, depois de algum acontecimento novo, como o início na escola, falecimento de pessoas próximas ou animais de estimação, chegada de um irmão, troca de babá etc. Enfim, esse comportamento é um alerta aos pais para ficarem atentos ao que está causando tais inseguranças e angústias, pois estes objetos são sinais de que a criança está se sentindo insegura e está precisando de acalento. Cada criança cria um mecanismo psíquico de defesa diferente para passar por essa fase de transição, alguns difíceis até de identificar (alteração do sono ou do apetite, choros mais frequentes etc.). É algo natural e inevitável e que ensinará como lidar não só com as etapas de transição da infância como também capacitará a lidar com as adversidades da vida inteira.

 

Maristela T. Lopes Ramos
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