Ainda que pareça a melhor forma de cuidar dos filhos, a verdade é que a
superproteção pode ter consequências graves no desenvolvimento de uma criança e/ou adolescente. É papel dos pais protegerem seus filhos, isto é saudável e imprescindível. Porém, os exageros podem ter consequências no desenvolvimento das crianças e adolescentes. Mas, quando a proteção se torna superproteção? Como perceber isso? Vamos entender um pouco sobre o desenvolvimento de uma criança.
“Todos nós nascemos com apenas alguns comportamentos inatos, então, os demais são ‘aprendidos’ nas interações sociais que temos no decorrer de nossas vidas. A criança cresce em um determinado ambiente, inicialmente lidando prioritariamente com seu núcleo familiar e posteriormente socializando na escola e em outros ambientes”, explica a psicóloga Fabiula Vasconcelos.
Ela ainda pondera que “é importante distinguirmos superproteção de proteção”.
A superproteção se define como a atenção excessiva dada aos filhos. “Pode parecer apenas mais um rótulo, e até uma forma de pôr em dúvida o modo como educamos nossos filhos.
Todos nós sabemos que a maneira como os responsáveis lidam com as situações cotidianas estimula determinados padrões de comportamentos nas crianças e, com o passar dos anos, estes ‘padrões’ vão se moldando em como as crianças/adolescentes vão enfrentar as situações do dia-a-dia. Em todos os nossos comportamentos com as crianças/adolescentes é importante questionar-nos: ‘Qual mensagem eu estou passando para a criança/adolescente?’”, acrescenta Fabiula.
A psicóloga ainda nos explica e cita alguns exemplos de comportamentos dos pais com seus filhos.
“Vejamos, como um exemplo, podemos citar que: se uma criança em idade adequada deseja se vestir sozinha, mas os pais não gostam da roupa que ela escolhe, tiram e a fazem colocar outra e nas próximas vezes não a deixam escolher. Qual mensagem eles estão passando para esta criança? Ela está sendo estimulada a aprender a fazer escolhas sozinhas? A entender quais roupas são ‘adequadas’ em quais ambientes? A ter autonomia em suas escolhas?”.
Quando isso acontece, acabamos impedindo que eles aprendam a tomar boas decisões baseadas em conhecimentos que já lhes foi dado previamente, desfavorecendo o desenvolvimento da independência.
“A palavra autonomia é a chave da questão neste artigo. As pessoas passam por várias fases do desenvolvimento antes de chegar a vida adulta (e continuam passando depois disso – enquanto há vida, há desenvolvimento)”, enfatiza Fabiula.
Segundo a psicóloga, cada fase tem suas características, suas peculiaridades e ressalta para nós a importância de que os pais busquem compreender quais são as potencialidades de cada fase e, a partir disto, que estas potencialidades sejam estimuladas.
“A autonomia deve ser compreendida atendendo a etapa de desenvolvimento que a criança/adolescente está. Por exemplo: para a criança, em determinada idade, é importante aprender sobre ‘atravessar a rua’. Então, o ideal seria que os pais explicassem várias vezes os pormenores (como ele deve se prevenir de um acidente, como usar as faixas de pedestres, como funciona o semáforo, olhar para os dois lados antes de atravessar, entre outras coisas) e que realizem esta atividade com eles repetidas vezes explicando-a, e em outra fase os filhos vão começar a sair sozinhos e este ensino anterior lhes dará autonomia para ir e vir em segurança quando estiverem no momento adequado. Isto é estimular a autonomia, entender o momento apropriado de ensinar e de deixá-los realizar sozinhos. Realizados é como eles se sentirão, mesmo com as pequenas conquistas: como colocar sua própria roupa, ao aprenderem e perceber que podem fazer sozinhos (mesmo que não fiquem perfeitos aos olhos dos pais). Para a criança será uma grande conquista e ela se sentirá autoconfiante para aprimorar e conquistar mais coisas”, afirma Fabiula.
A autonomia é desenvolvida de forma equilibrada e contribuirá para que um dia esta criança se torne um adulto independente e emocionalmente saudável. É preciso ter paciência e afeto, ensinar constantemente e depois deixar que a criança/adolescente faça as atividades sozinha.
Mas o que tudo isso tem a ver com a superproteção? “Este fenômeno ocorre quando os cuidadores se negam a dar a autonomia para a criança/adolescente no momento em que é crucial que eles possuam. Isto ocorre pelos mais diversos fatores, lembrem-se: pais são seres humanos também, dotados de potencialidades e limitações. Quando a autonomia não é incentivada pode gerar consequências negativas no ser em desenvolvimento, pode afetar sua autoestima, sua socialização, sua autoconfiança, cada ser é único e não é possível prever como e se a superproteção afetará a vida, mas, na maioria das vezes, tornam-se crianças/adolescentes inseguros”, responde a psicóloga.
Além disso, Fabiula conta que é importante que as crianças/adolescentes sejam sempre estimuladas a assumir a responsabilidade pelas suas próprias ações, e esta é uma parte importante em ser independente. “Quando os pais interferem em uma ação, evitando que a criança/adolescente sofra as consequências pelos seus atos, ao invés de ajudar, na verdade, atrapalham o seu desenvolvimento.
Construir a consciência de que as ações terão resultados e é responsabilidade de cada um lidar com o mesmo, é crucial. Aprendemos com as nossas vivências e só fazemos isso lidando com as consequências. Um exemplo simples seria quando uma criança ‘esqueceu de fazer a lição de casa’, e os pais fizeram por ela, pois, não havia mais tempo dela mesma realizar. Qual mensagem é passada para a criança com este comportamento? A criança está sendo estimulada a assumir a responsabilidade por sua tarefa? Vivenciou as consequências negativas de sua ação (esquecer de fazer a tarefa)?”, completa Fabiula.
Devemos ter em mente que outro aspecto importante da superproteção é a frustração que ela pode causar. “Quando há a superproteção, a criança cresce sem lidar com o erro. Mas, na condição de ser humano, o erro é inevitável e se não temos uma relação saudável com nossos próprios erros, as frustrações podem ser avassaladoras e prejudiciais à nossa saúde emocional. Para criar esta relação saudável, é preciso estar em um ambiente onde errar é aceito como parte do ser humano, e é extraído o melhor desta situação: o aprendizado que este erro trouxe”, explica Fabiula.A psicóloga ressalta que “educar uma criança é uma missão encantadora e desafiadora, os pais também são seres humanos dotados de qualidades e defeitos. Muitas vezes, vão errar e muitas outras acertar. Usualmente, os pais que superprotegem o fazem com boas intenções, mas, podem ter consequências a longo prazo sérias no desenvolvimento de seus filhos.
O importante é manter sempre o amor como primordial nesta relação, que os pais sempre autorreflitam sobre seus comportamentos e busquem conhecimento/auxílio no momento que acharem necessário”, comenta.
Por fim, Fabiula explica que as crianças e adolescentes devem ser estimulados o tempo todo para um dia serem seres totalmente independentes e emocionalmente saudáveis.
“Um ótimo jeito de estimulá-los é com carinho, apoiando-os em suas decisões e mostrando os caminhos do certo e do errado, mas, lógico, deixando-os decidirem qual caminho seguirem. Isso vai torná-los adultos com sabedoria e bom desempenho para um futuro maior.
O papel dos pais é o de ser suporte, tanto nas horas boas quanto nas ruins, nos quais a criança e o adolescente vão saber que podem contar com o apoio sempre que necessitarem e buscar sempre o equilíbrio entre a proteção e o incentivo para a autonomia”, finaliza.